Não sei se já alguma vez vos aconteceu, mas a mim é uma constante da vida. Parece que sempre que estou com pressa alguém surge do nada, ou alguma coisa acontece, e acaba por me atrasar a vida.
Dirijo-me a uma caixa multibanco para fazer um simples levantamento. Ela está ali à minha frente, a uns míseros 10 metros de distância, e vislumbro que ninguém está a usa-la. Óptimo. Estugo mais o passo para a alcançar. Mas, eis senão quando, vindo de uma esquina qualquer, um velhinho aparece e apressadamente acaba por se colocar entre a máquina e eu. Tento não ligar ao infeliz acontecimento e aguardo pacientemente a minha vez, atrás dele. Um levantamento também não demora assim tanto tempo. É aí que observo o velhinho a tirar do bolso do casaco uma factura já toda amarrotada, rasgada e amarelada. Prepara-se para efectuar um pagamento. Começo a ficar preocupado e impaciente, mas finjo que não vejo. O velhinho começa então a digitar as teclas lentamente, confirmando cada dedilhada com o algarismo que tem naquele maldito papel. Por vezes, e para ajudar, o sol bate de chapa cegando-o daquilo que vai acontecendo no ecran. Por estas, ou outras razões (que por vezes a própria razão desconhece), como não é lesto a efectuar a operação esta acaba por ser anulada e vai daí todo o procedimento terá de ser, inevitavelmente, repetido. Começo a pensar que é de propósito e às vezes dá-me vontade de lhe dizer que eu próprio faço a operação. Mas nunca o fiz. Ao invés, cerro os dentes.
Mas nem sempre é assim. Também há aqueles dias em que a caixa está desocupada. E ninguém surge da tal malfadada esquina. Mas também é precisamente nesses dias que a caixa não tem dinheiro (vá-se lá saber porquê) e que aquele “bonequinho” com um sorriso trocista me diz que devo dirigir-me ao Multibanco mais próximo. Cerro os dentes, ainda com mais força.
No supermercado tenho a tendência parva de me dirigir para as filas mais curtas. Quando a opção está tomada tendo, para meu infortúnio, a aperceber-me de quem são os últimos das caixas que me ladeiam e que a vista alcança. Pois bem, não há um único dia (se calhar, estou a exagerar um pouco) em que esses personagens não se despachem antes de mim, pois a senhora que está à minha frente traz um maldito produto que o leitor de código de barras não consegue descortinar o preço. E vai daí, a menina da caixa tem de chamar, através de um estúpido telefone, o supervisor que está, normalmente, escondido no canto mais afastado daquele supermercado. Os meus dentes cerram-se ferozmente.
E quando estou de carro. Aí o fantástico acontece. Por vezes vou quilómetros atrás de alguém que anda perdido (só pode), ou do velhinho que me havia atrasado na caixa multibanco. Quando julgo que essa marcha lenta terminou, pois o carro muda de direcção (seguindo tranquilamente o seu caminho, atrasando a vida a mais alguém), vindo de uma encruzilhada qualquer ou da rotunda que me vejo obrigado a entrar, aparece um camião de transporte de mercadorias (quando não é do do lixo, à noite) que por uma questão de prioridade (e porque é maior que o meu) coloca-se à minha frente e deixa-me com a marcha ainda mais vagarosa. Os meus dentes cerram-se à velocidade da luz.
Há quem diga que todas estas esperas são sinais. Sinais que cada vida tem um ritmo próprio e que esse ritmo deve ser respeitado. Se não fosse a espera na fila da portagem o acidente que se verificou uns quilómetros mais à frente poderia ter tido outro protagonista - eu. Acredito um pouco nisso. E é por isso mesmo que, sempre que estas esperas me acontecem, cerro os meus dentes com muita força e penso, "Obrigado por mais este atraso de vida.".
Luís Alturas, 01 de Julho de 2011